terça-feira, 12 de janeiro de 2010




Um dia desses um amigo me disse que era a representação do espelho côncavo (ou era convexo? Sei lá, confundo-me em meio ao labirinto tipológico dos espelhos). Isso me fez pensar. Por que esse nosso vício em espelhos e reflexos? Somos, assim mesmo, tão incompletos? Lembrei-me, inevitavelmente, de Manuel de Barros. Transcrevo-o, mais uma vez, a seguir:

XI

Bernardo é quase árvore.
Silêncio dele é tão alto que os passarinhos
ouvem de longe
E vêm pousar em seu ombro.
Seu olho renova as tardes.
Guarda num velho baú seus instrumentos de trabalho
1 abridor de amanhecer
1 prego que farfalha
1 encolhedor de rios - e
1 esticador de horizontes.
(Bernardo consegue esticar o horizonte usando 3
fios de teias de aranha.
A coisa fica bem esticada.)
Bernardo desregula a natureza:
Seu olho aumenta o poente.
(Pode um homem enriquecer a natureza com a sua
incompletude?)

Manoel de Barros, mágico pantaneiro e cavalo de Bernardo - Livro das Ignorãças, 1993


Postado por Diário Halotano.

Nenhum comentário: