quarta-feira, 30 de dezembro de 2009




Pouso de emergência em Nova Iorque! Todos aclamam o piloto, mais um dos novos heróis midiáticos que logo são esquecidos; 15 minutos metafóricos de fama, primeira página de jornal. Todavia, seria a queda do avião no rio Hudson em Nova Iorque um evento efetivamente "histórico"? Ou minha entrevista no Colégio Wellington, ocorrida neste mesmo dia, quase nesta mesma hora?

Lembro-me deste dia 15 de janeiro. Enquanto as retrospectivas giram na TV, empreendo a minha própria, aqui, no recôndito, discreto. Soube do acidente ali mesmo, no Colégio Wellington, quando ainda ali, na recepção, havia um grande televisor, hoje usado na sala de vídeo. Esperava a hora da minha entrevista. Tinha sido uma manhã de memórias aquela. Voltava eu para a Freguesia do Ó, em São Paulo, após anos da saída de meus avós daquele bairro-vilarejo. Visitara a rua onde moraram por anos. Lera uma revista filosófica, comprada na banca dos gibis da infância. Wolverine em Walter Benjamin.

Fui entrevistado. Encontrei um amigo, também à espera de um novo emprego. Apresentei-me. Performático. Convenci. Passei. Trabalhei duro ali. Foi naquele recinto, sob os umbrais daquelas salas, que ultrapassei o ano mais desafiador de minha carreira profissional. 2009 foi longo. Venci a gripe suína, os prazos, as escriturações, as apostilas, as histórias, a geografia, os alunos, as burocracias sem fim. Fiz novos amigos e ganhei novas dores de cabeça.

E agora, passado o ano, rememoro. Sinto-me como "Funes, o memorioso", de Borges. Precisaria de todo o ano de 2010 para absorver tudo o que me ocorreu em 2009. Como isso não é possível, simplesmente seleciono e esqueço. Afinal, esquecer não é o fio de ouro do lembrar? Sim, é.

E, ao esquecer, agradeço. Deixo um muito obrigado às novas amizades, que forjo também para os anos próximos. Para a Elise, que me suportou, sob a névoa de um 2009 que se recusava a acabar. Para Deus, infinito, onipotente, meu Salvador. Enfim, 2009 é findo. Sobrevivi. Feliz 2010.

Postado por Diário Halotano.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

[Imagem não disponível. Não parece haver imagens para o que dói no coração.]


Muitas vezes eu simplesmente gostaria de estar sozinho no mundo, nem que por algumas horas, dias. Outras, sinto as dores do mundo todo, dentro desta caixa que chamo de corpo. Ontem, percebi o valor que há na coexistência de indivíduos, não da humanidade. Hoje, a ambivalência de estar dentro de mim mesmo. Quero o que não posso ter, o intangível. Não alimento desejos pelo que já mantenho posse. O que poderia ser mais moderno do que este sentimento?

Seria este cálice amargo apenas o apego pelo novo, a "novolatria", tão característica da Modernidade? Estaria eu antevendo a ociosidade do período de férias, tão assustadora para alguém viciado em trabalho? Que rios correm em mim? Que limites e fronteiras se debatem tão freneticamente dentro do meu peito aberto e nu? Quais obrigações quero eu evitar? Quais prazeres quero fruir, na ilusão da felicidade infantil, que não sabe maturar o esforço, a dor, a decepção?

Quais as vésperas, enfim, do dia de hoje? Quais os batimentos cardíacos que me trouxeram para o que hoje sinto? Coração canhoto? Ainda e de novo? Há respostas para indagações existenciais, em um mundo materialista? Há materialismo de fato, em um self tão carente da experiência "benjaminiana"? Há um self, em si? Há Hegel, Kafka, Benjamin e Marx?

O mundo, fora de mim mesmo, existe? Como se apresenta, em uma situação histórica tão fragmentada e, ao mesmo tempo, massificada? Qual o lugar filosófico desta ambivalência fratura-homogeneidade? Ou tanto melhor, qual o meu lugar? Qual minha identidade cultural? Existe? Sou? Quem?

Postado por Diário Halotano.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009


Foto: "O Estado do Tapajós Online"


O que é a Várzea senão "a campina plana às margens de um rio que em época de enchente é inundada com as águas deste último"; segundo a definição da Wikipédia, muito mais sabida do que todos nós?

Ah, mas eu digo a você que muitos outros significados possuem esta palavrinha na sabedoria popular, outra muito mais astuta do que nóis tudo junto!

Quem nunca ouviu a palavra sendo usada quando uma situação muito, mais muito inacreditavelmente precária acontece? Sabe, quando a "vaca vai pro brejo"? Quando o seu chefe pede uma coisa hoje, outra, oposta, amanhã? Quando seu aluno pede um ponto a mais na média, mas fala sério. Mesmo! Até argumenta contigo... (Pior! Quando sua própria liderança pede um ponto a mais... Ah, deixa pra lá...) Ou quando você encontra na empresa erros seriíssimos de estrutura, ou simplesmente a falta dela. E por aí vai...

Poderia eu ficar aqui por longos parágrafos descrevendo situações varzeanas. Horas a fio de leitura, descrição, análise, crítica, gracejo, memória, várzea. Porém, contudo, entretanto e todavia, prefiro ficar com o poeta...

"Vida Varzeana é a minha.
Chuva, cheia, charco, cheiro, Chica, chimarrão, cachaça, chispa!
Hoje, tudo molhado, amanhã e depois...
Sei lá, quando seca perde a graça. Quando alaga é o de sempre.
A novidade seria nunca mais ver tudo fora do lugar.


Vida Varzeana é a minha.
Resisto enquanto posso!
Búfalo de casco estreito, água de passo largo...
Hoje chove, amanhã e depois...
Sei lá, novidade seria eu parar de lutar!


Postado por Diário Halotano.