sexta-feira, 17 de julho de 2009


Imagem: http://pixs.media.mit.edu/pictures/show/12058


Sacode as nuvens

Sacode as nuvens que te poisam nos cabelos,
Sacode as aves que te levam o olhar.
Sacode os sonhos mais pesados do que as pedras.

Porque eu cheguei e é tempo de me veres,
Mesmo que os meus gestos te trespassem
De solidão e tu caias em poeira,
Mesmo que a minha voz queime o ar que respiras
E os teus olhos nunca mais possam olhar.

(Sophia de Melo Bryner Andresen)



Quando pensamos sozinhos sobre integridade, ou quando aconselhamos a alguém: "seja honesto consigo mesmo", geralmente não associamos a esta ideia uma outra, a de "história de vida". Apesar de estarmos todos vinculados pelo contexto severo das relações em forma de mercadoria (cf. Marx) e pela lógica do espetáculo (cf. Marcuse), somos indivíduos com trajetórias diversas e, portanto, com maneiras suavemente distintas de manifestar ao outro nosso entendimento acerca da retidão moral que nos serve de base.

Todos nós, com exceção justa daqueles que sofrem com algum grau de amnésia, somos seres construídos por nossas memórias. Memórias recentes, esquecimentos intencionais, traumas de infância, felicidades, dores, angústias, prazeres, imagens inventadas nas nuvens... Nossa bagagem memorial, como um espelho quebrado, ao chão, é uma coleção de cacos, que juntamos e separamos, conforme a vida se apresenta por debaixo de nossos pés. E, é claro, cada um de nós tem sua própria mala de lembranças.

Assim, no momento exato em que precisamos ser honestos conosco mesmos, ou com o outro, utilizamos nossas "roupas da memória", colocando em xeque nossa integridade, ou nossa compreensão do que ela seja. Ao menos, é isso que fazem os reflexivos, afinal, aqueles movidos por impulsos não refletem, simplesmente atuam em um palco que sempre parece pequeno demais para o seu self.

Decisões, como já se cansou de repetir o clichê, são feitas todos os dias e, sem ao menos percebermos, são resultados de um mapeamento cerebral (quanto maior a área geográfica, mais preciso é o resultado, por incrível que pareça) muito eficaz de nosso conjunto memorial. Nosso cérebro, fora de nosso controle, executa uma varredura daquilo que aprendemos, do que já deu certo, ou errado, de nossas convicções religiosas, de acontecimentos alheios, etc. Ao final, tomamos uma decisão baseada em critérios essencialmente memoriais, mesmo quando uma situação completamente nova nos é apresentada pela realidade circundante.

Não e à toa que muitas de nossas descobertas (leia-se epifanias) nos vêm em situações críticas, nas quais somos confrontados com os maiores desafios de nossa integridade e honestidade. Em contextos desafiadores, nossas memórias dançam com nossos receptores cerebrais, causando ondas decisórias importantíssimas, que, por sua vez, marcarão nossa história de vida e, é claro, nossas decisões futuras.

Nesse sentido, somos nós mesmos o espelho quebrado ao chão. Divididos em memórias tão complexas quanto a quantidade de cacos a nossa disposição. Nunca conseguiremos juntar os pedaços de nós mesmos, pois nossas memórias sempre se apresentarão aos estilhaços, embaralhadas, esperando o momento certo para se manifestarem. Essa é a razão de nossa angústia essencial: o preço da complexidade do espírito humano.

Postado por Diário Halotano.

segunda-feira, 13 de julho de 2009




Eu estou em Férias. O Diário Halotano também.

Até Agosto.

Postado por Diário Halotano.