segunda-feira, 27 de junho de 2011

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Sempre me pergunto se a epifania pode ser comunicada! E sempre me respondo que não... E, como uma imagem definitivamente não fala por mil palavras, que somente o laranja, o amarelo, o vermelho comuniquem algum sentimento hoje.

Tchau.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

sobre morangos e champagne...

Abro a geladeira, é madrugada, dia de semana, perto de um feriado qualquer, está frio, não consigo deitar os olhos. A noite toda perturbou meu sono com muitas imagens circulantes. Imagens que passavam muito rápido, cenas da memória, visões, como que em curto, em flashes, piscando, oscilando, sumindo e aparecendo. Insone, ansioso e cambaleando, abri a geladeira. Toda a sua brancura iluminada me ardeu a visão. A brisa gelada me paralisou o corpo inteiro, seminu. Alvas e estéreis, as prateleiras não ofereceram nada. Como em um sussurro, a própria fantasia se confessou: "O que você procura não está aqui dentro". Eu queria o amor, queria muito o amor, mas só achei cubos de gelo. E, como que em uma fração de milésimos de segundo, de repente, era uma delícia segurar o cubo de gelo em minhas mãos descalças. Sólido e líquido, desfazia-se por entre meus dedos quentes. E, a cada toque, beijava-os, como quem nunca mais teria aquela oportunidade de novo. E, a cada beijo, o cubo, em água, transformava-se. Tornava-se, não sem se debater, parte de mim, eu dele. Celebramos ali, na escuridão, de olhos bem fechados, completamente cegos, o prazer da vida em meio a um mundo morto, envidraçado e vil. Tateando no escuro, achei um pedacinho de renda preta, já partida pelas chamas de um passado distante, vivo. Senti, mais uma vez, aquele perfume inesquecível. Dormente, inebriado e cego, fechei a porta da geladeira. Cobri o gelo com aquele pedaço queimado de tecido, apertei-o contra meu corpo, dormi. Naquele instante, guardei todos os meus rótulos dentro do peito. Descobri quem eu era, quem eu realmente era. E, nunca mais, apresentaria a mim mesmo ao sabor dos outros. Que se sufocassem todos ao redor, já não me importava mais.

drag queen

Hoje (não exatamente hoje) senti vontade de ter aquela peruca laranja, só para que viesse comigo, para qualquer lugar que fosse. Não me importa mais o destino, o caminho, a saída. Estou à deriva, como nunca pensei que estaria de novo um dia. Não me importa mais o jogo, as frases, os desafios. De todas as minhas metáforas, escritas, imaginadas e vividas, só me sobrou a fuga. Estamos em pé, no aeroporto, com uma mala cheia de dinheiro. Pensa logo! O dinheiro não é nosso. Mas e o coração?

domingo, 5 de junho de 2011

um dia eu escrevi um texto sobre a relação entre as pessoas e a arquitetura. era um texto breve, desses que colocam no papel percepções elementares sobre as coisas e as pessoas. o texto dizia que muitas vezes enxergamos toda a nossa realidade como simples paisagem. deste modo, veríamos os transeuntes como objetos, simples partes de um todo, metonímias das edificações, peças de um quebra-cabeças mental, cores primárias de uma estrutura imagética da metrópole, caleidoscópio.

todavia, essa relação se dava de modo inconsciente, como se não fôssemos capazes de apreender o fato de que não víamos as pessoas como gente, sim como tijolo. então, o texto, em um salto como este de agora, tratava do próprio espectador que, como tal, era incapaz de, ele mesmo, interagir com a cidade, seja em sua arquitetura, seja em seu espectro social. sem se aperceber, mais uma vez, era, ele próprio, pedaço daquela paisagem observada, não era sujeito, era conteúdo.

movido por este raciocínio, me colocava à disposição da cidade. fotografava suas cenas e cenários, suas ações e interações, sua estética, sua estática, seu movimento, sua paralisação. olhava as formas e cores da cidade. observava a catedral da sé, o teatro municipal, aquelas ruazinhas do centro (perto do teatro) onde se vê o infinito, o viaduto do chá, a estação da luz... tentava traduzir meu sentimento, queria, de alguma forma, metafórica ou não, fazer parte daquelas construções, encher os pulmões, ter as mãos livres, porém, sinédoque, me via paisagem.

então, como que de súbito, fui tomado, hoje, por um outro caco de ideia. uma noção de que durante todo o último ano essa inquietação arquitetônica simplesmente não fazia nenhum sentido, não tinha sequer uma fagulha de importância. por que me incomodava tanto, então? se não fizera cócegas em meu cérebro no ano anterior, e talvez não o fizesse de novo ano que vem, porque me angustiava a perspectiva da ausência do sentimento?

aí pensei, como que tentando me confortar a mim mesmo, em torvelinho: sabe, quando sentimos as coisas, elas podem parecer indiferentes dentro de nós. mas não o são. um dia elas saltam aos nossos sentidos como elementos essenciais à sobrevivência do coração, da alma. daqui a um ano, toda essa relação entre arquitetura e o ser pode não ser a sensação essencial de nossas vidas, mas estará lá, latente, como que esperando solução, conclusão, destino. a vida, como uma grande mão, nos puxa de um lado para o outro. cabe a nós, senhores de nossas existências, tentar a sobrevivência do que nós é essencial, único, palpitante.

pensei, mais uma vez, como que para não perder o hábito, como que para não perder a mão, como que para não perder a chance, em uma de minhas personagens... e lembrei de como ela me tem sido essencial nessas divagações todas sobre a sinédoque entre corpo e peças arquitetônicas. minhas angústias têm sido minoradas ao encontrar eco nas suas. ao falarmos ou escrevermos sobre essas relações todas, eu e minha personagem, sentimos um sentimento comum, igual, o mesmo. e ficamos apagando e reescrevendo nossas frases, insuficientemente boas. e ficamos fotografando e destruindo fotografias, por serem elas apaixonantes demais para aparecerem aqui neste espaço, todo indireto e em segredo. somos, juntos, um sentimento que não conseguimos traduzir, simplesmente pulmões cheios e mãos livres.