quinta-feira, 23 de junho de 2011

sobre morangos e champagne...

Abro a geladeira, é madrugada, dia de semana, perto de um feriado qualquer, está frio, não consigo deitar os olhos. A noite toda perturbou meu sono com muitas imagens circulantes. Imagens que passavam muito rápido, cenas da memória, visões, como que em curto, em flashes, piscando, oscilando, sumindo e aparecendo. Insone, ansioso e cambaleando, abri a geladeira. Toda a sua brancura iluminada me ardeu a visão. A brisa gelada me paralisou o corpo inteiro, seminu. Alvas e estéreis, as prateleiras não ofereceram nada. Como em um sussurro, a própria fantasia se confessou: "O que você procura não está aqui dentro". Eu queria o amor, queria muito o amor, mas só achei cubos de gelo. E, como que em uma fração de milésimos de segundo, de repente, era uma delícia segurar o cubo de gelo em minhas mãos descalças. Sólido e líquido, desfazia-se por entre meus dedos quentes. E, a cada toque, beijava-os, como quem nunca mais teria aquela oportunidade de novo. E, a cada beijo, o cubo, em água, transformava-se. Tornava-se, não sem se debater, parte de mim, eu dele. Celebramos ali, na escuridão, de olhos bem fechados, completamente cegos, o prazer da vida em meio a um mundo morto, envidraçado e vil. Tateando no escuro, achei um pedacinho de renda preta, já partida pelas chamas de um passado distante, vivo. Senti, mais uma vez, aquele perfume inesquecível. Dormente, inebriado e cego, fechei a porta da geladeira. Cobri o gelo com aquele pedaço queimado de tecido, apertei-o contra meu corpo, dormi. Naquele instante, guardei todos os meus rótulos dentro do peito. Descobri quem eu era, quem eu realmente era. E, nunca mais, apresentaria a mim mesmo ao sabor dos outros. Que se sufocassem todos ao redor, já não me importava mais.

Um comentário:

Fabiana Nista disse...

O texto me traduziu o mais terno amor, aquele que está inquieto dentro da gente, doido pra sair e ser compartilhado. Daí ele não se aguenta e encontra consolo num simples cubo de gelo, que assim como qualquer pessoa que compartilhasse desse momento, derrete-se ao calor desse amor contido,e faz -se parte da gente... Ai que delicia esse texto, que me trouxe à lembrança o amor incondicional, que não depende do outro para existir, ele é nosso, só nosso e ninguém tira ele da gente! Obrigada por mais um texto delicioso Adrian