quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Prostituindo a Pena!

hoje me olharam de viés e me chamaram de biscate.

então eu tentei revidar, olhar no olho e gritar que me olhasse de volta. que seus olhos tocassem meus olhos e tivessem coragem de repetir tudo aquilo. eu dizia: "bate na minha cara e me chama de putinha! ao menos olhe na minha cara, filho de uma puta!"

só o que me vinha de volta era um rosto carrancudo e inerte: "prostitua sua pena, maldito! dobre seu corpo até que não sobrem mais calças ou dignidade. você não é nada, não é ninguém. 20%. É tudo o que eu te dou!"

sorri. lúcido como nunca. algum dia tinha sido diferente? em algum momento tratou-me com o respeito que eu sempre mereci? algum dia havia recebido eu algum reconhecimento pelo árduo trabalho de dias e dias, noites e noites, madrugadas inteiras, incansáveis, insones, desvirtuadas e vãs?

nunca! só frigidez e desalento. a solidão daquele quarto escuro de estações repetidas. a mesma sineta de horários contínuos sem intervalo. sempre nu, desnudo e pelado. sempre transparente, oposto ao velado de seu rosto carrancudo e inerte.

"ajoelhe-se, seu pedaço de bosta! lamba minhas botas com sua saliva, sua risca de giz, sua esferográfica azul barata e grotesca. que se fodam suas belas ideias sobre o mundo e nossas crianças. não passa de uma poliana, ingênua, pobre, tola e submissa".

sempre sem olhar no meu olho, chutou-me o meio da boca. mordi minha língua e não consegui mais falar coisa alguma. resignei-me, recolhi-me em meus cacos, calei-me e apenas senti a dor, as dores, muitas. chorei.

2 comentários:

Fernanda disse...

Curvo-me diante de seu texto.

Nádia disse...

Não sou capaz de mensurar, mas imagino a dor que surge ao ver o ato de compartilhar uma parte de si ser reduzido a nada. Sim, muitas matérias são esquecidas, pra alguns não faz diferença realmente se aprendem algo ou se simplesmente passam, mas é difícil esquecer o contexto, a pessoa que se dispôs a participar de alguma forma da sua vida, seja naquele presente, na sala de aula, ou no futuro, quando você se lembra que alguém, que não tinha a menor obrigação, te apoiou. Não se preocupe com os 20%, Adrian, pra eles não importa. Continue, nem que seja pra um ou dois...